resenha

Lendários – Tracy Deonn

28 set 2021
Informações

Lendários

Tracy Deonn

Intrínseca

série Lendários #1

592 páginas | 2021

3.75

Design 3.5

História 4

12

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Partir parecia a fuga perfeita para Bree Matthews. Na verdade, a única fuga possível. Após perder a mãe, tudo que a menina de dezesseis anos quer é se manter longe das lembranças e das palavras carregadas de ressentimento na última discussão que tiveram. Por isso, Bree decide entrar em um programa da Universidade da Carolina do Norte para estudantes de excelência acadêmica. Um novo começo, distante da pessoa que ela era antes de tudo desmoronar.

Mas então, em seu primeiro dia no novo lar, Bree vê um demônio, e essa descoberta aterrorizante a conduzirá até os Lendários, membros de uma ordem secreta formada por descendentes dos cavaleiros da Távola Redonda do rei Arthur, jovens responsáveis por caçar e destruir essas criaturas demoníacas e proteger a humanidade.

Aos poucos, entre memórias enevoadas, ela percebe que não é a primeira vez que se depara com os Lendários, e que esse reencontro pode não ser mera coincidência. Com a ajuda de Nick, um ex-membro que quer distância da Ordem, Bree se infiltra nesse mundo de magia, privilégios e segredos para descobrir o que realmente aconteceu em seu passado. Ela só não contava que precisaria lidar com a desconfiança de um feiticeiro misterioso e com uma verdade avassaladora: os Lendários não são os únicos com o dom da magia. Dentro de Bree há uma força ancestral que ela ainda não consegue entender, mas que pode ser decisiva quando Camlann, a guerra final entre magos e demônios, chegar. Resta a Bree decidir se usará essa força para se unir à luta da Ordem ou para destruí-la de vez.

Lendários é a estreia arrebatadora e premiada de Tracy Deonn, o primeiro volume de uma fantasia eletrizante e sensível sobre a jornada de uma jovem para entender a origem de suas dores e de seus poderes. Com uma narrativa poderosa e personagens marcantes, o livro figurou por semanas na lista de best-sellers do The New York Times, foi indicado ao Hugo Awards, um dos prêmios mais importantes de fantasia, e recebeu, entre outros, o Coretta Scott King-John Steptoe Award para Novos Talentos, concedido a livros jovens e adultos escritos por pessoas negras.

Design

Posso dizer que eu gostei da capa mas fiquei um pouco decepcionada com o resultado final? Eu achei a ilustração da Briana linda com a mistura dos elementos mágicos da história, mas eu esperava um pouco mais de suporte visual no resto dos componentes da capa.

Acho que o que mais me incomoda de verdade é o efeito de gradiente + dropshadow + bevel&emboss que foi usado no título. Eu lembro do início dos anos 2000 quando a gente criava actions no Photoshop pra emular essas aparências de metálico/reflexivo e ficou beeeem datado na capa.

“Ah, mas Samara, como você resolveria esse seu incômodo idiota?” Não sei. Ia depender muito de qual seria o briefing de arte da capa, e design gráfico não é meu forte, apesar de eu ter estudado na faculdade.

Uma coisa que eu sou bastante grata nesse projeto é a decisão da Intrínseca de usar o papel Ivory Slim no miolo. O livro tem 592 páginas e se fosse em Pólen, provavelmente ele ficaria ainda mais grosso e pesado. Estou há muito tempo fora da academia pra ficar levantando peso, mesmo que seja de conhecimento. 😅

Do miolo não tem muito o que falar porque Lendários tem uma versão relativamente simples. Tem divisórias de partes e aberturas de capítulo com um grafismo que também é usado na intervenção do logo da Intrínseca. Mas fora isso ele é bastante padrão-básico, porque nem tem cabeçalho nas páginas.

A fonte é uma das que costumam ser usadas nos livros que tem um volume maior de páginas, porque ela consegue usar um tamanho menor e ainda manter a legibilidade. Eu estou chegando em uma idade em que consigo ler esse tamanho, mas já começo a ficar um pouco cansada porque a página fica parecendo um pouco massiva de conteúdo.

Um última consideração é que eu achei diversos erros de revisão no livro. Em um momento específico, na página 223, existe uma troca do pronome que Greer usa para se identificar e isso gera muita confusão pro leitor que não está acostumado com neo pronomes e linguagem inclusiva.


História

(…) Não defina a sua vida pela perda. Defina a sua vida pelo amor. p.460

Se você já é um leitor do blog sabe que eu tenho dificuldade de encontrar YAs que funcionem pra mim. Então, achar um que eu goste e me divirta é um super diferencial.

Não que a opinião de uma senhora como eu sobre livros de personagens adolescentes tenha algum mérito ou peso na sua decisão de leitura. 🤷‍♀️

De qualquer forma, eu gostei de Lendários e foi uma ótima decisão conhecer a escrita de Tracy Deonn. E o principal motivo foi ser uma renovação das lendas Arthurianas. Depois da mitologia grega, um dos temas que eu mais gosto é do Rei Arthur e a Távola Redonda.

Eu já vi e li algumas coisas sobre o tema mas, invariavelmente, o que mais me marcou foi a série As Brumas de Avalon da Marion Zimmer Bradley. Toda essa camada feminina e feminista na lenda de Arthur meio que ajuda a quebrar todo o clichê de chosen one e um universo voltado somente pra homens.

Na versão de Tracy Deonn, além dessa camada feminista, ela ainda acrescenta questionamentos sobre privilégio, escravidão, racismo, e cria um sistema de magia que foge do padrão “europeu”.

Mas vamos falar sobre a história. O livro começa com Briana/Bree e sua melhor amiga Alice fazendo 💩driblando as regras da nova escola que acabaram de entrar. Parênteses aqui: qual é a de todo adolescente americano que quando vai para a faculdade precisa quebrar todas as regras e fazer todas as bostas possíveis? Na verdade, qual é a de todo adolescente? 😅Fecha parênteses.

Elas passaram para um programa de “pré-faculdade” na UCN, e Briana arrastou sua amiga para essa noite “alucinante”. E eu fiquei um pouco com preguiça da protagonista e torcendo para que fosse só a autora construindo a base para que ela pudesse mostrar algum crescimento ao longo da história.

Assim, Briana está passando pelo processo de luto pela morte de sua mãe. Fazem três meses do acidente e ela criou uma barreira entre o sofrimento e a “vida normal”. Ela não quer ajuda, ela está reativa, mas ela acima de tudo se sente culpada porque teve uma discussão ridícula daquelas mãe/filha e agora ela nunca mais vai poder se redimir.

Ninguém quer escutar respostas verdadeiras. O que a turma do “meus pêsames” quer é se sentir bem por ter perguntado. Esse jogo é horrível. p.19

E é preciso dar crédito para Tracy Deonn porque você consegue sentir o sofrimento de Briana. Seu comportamento de afastar as pessoas que de alguma forma relembram sua mãe, o distanciamento do pai que também está sofrendo por perder o amor de sua vida.

No fim das contas, a noite alucinante de Briana e Alice foi o primeiro encontro da protagonista com um universo mágico que ela não fazia ideia que existia. Mas rendeu uma briga grave entre as amigas, já que Alice não consegue mais se conectar com Briana.

E também o reitor dá um castigo para a protagonista que agora vai ter um mentor para saber como se comportar no ambiente da UCN. E é aí que a história começa a ganhar cadência porque é através de Nick que a gente vai realmente conhecer o lance da távola redonda.

Pulando todo o processo da Briana tentando descobrir qual é o lance dos demônios surgindo na faculdade e se metendo na sociedade secreta da Távola Redonda, eu gostei BASTANTE da história que autora criou para explicar a existência desses cavaleiros de Arthur até hoje e toda a organização hierárquica da ordem.

Existem diversas camadas sobre o relacionamento entre os herdeiros, vassalos, pajens, escudeiros… é tanto nome que você pode ficar um pouco enrolado e perdido. Aliás, tem TANTO personagem no núcleo da távola que chegou um ponto que eu simplesmente desisti de guardar quem era quem e herdeiro de quem e me foquei só nos coadjuvantes mais ativos/importantes.

Aliás, Nick e Selwyn são ótimos personagens, apesar de serem meio clichezinhos. Nick é o herói relutante mas totalmente puro e protetor. Selwyn é o Merlin da ordem da Carolina do Norte, e ele é aquele tipo revoltado e sombrio, envolto em mistério e que odeia Briana desde o primeiro momento.

Já viu, né? 👀

E é isso mesmo. Merlin é tipo um “trabalho” no universo de Lendários. Algumas pessoas tem acesso a poderes mágicos alimentados pelo eather que conseguem acessar. E com isso, criam armas e armaduras, mesmerizam pessoas para mudar suas memórias, consegue criar uma ligação entre os lendários através de promessas… É muito poder.

Mas Tracy Deonn não cria só uma visão para a magia de Arthur e seus cavaleiros, mas também toda um sistema de magia com matriz africana, baseada na troca e agradecimento para a natureza e para os ancestrais. Briana tem um caminho pela frente de descobrir os segredos do ramo materno da sua família e como isso influencia na sua vida, no seu relacionamento com a mãe, e em como pode impactar no sua permanência na Ordem da Távola Redonda.

Lendários, apesar de uma história movimentada e com personagens interessante e bastante diversos, consegue ter tempo para tratar de assuntos atuais e muito importantes: o elitismo das escolas americanas, violência policial, racismo e a necessidade de uma reparação histórica por conta dos séculos de escravidão, e normaliza o que deve ser normalizado como relacionamentos e pessoas LGBTQIA. Todos esses assuntos são tratados com bastante destaque e em momentos cruciais pra história.

(…) Três comentários, três suposições, três pessoas que me singularizaram por causa da minha aparência e daquilo que eles decidiram que represento. Em quarenta e oito horas. p.123

– [Meu pai] é venezuelano. Mas eu pareço branca, então as pessoas não percebem que tenho ascendência latina. Ou esquecem. Elas dizem coisas racistas na minha frente o tempo todo. p.175

Além disso, é um livro bastante diverso com várias representações nos personagens. Foi um dos livros mais diversos que já li, inclusive utilizando neo pronomes para um dos personagens, que é não-binário. Quero tratar um pouco sobre isso, mas vou deixar para o final.

Preciso dividir que apesar de ter me divertido bastante e gostado do universo, tiveram três coisas que me incomodaram na história.

Tem sempre alguma coisa acontecendo para movimentar a história, mas em alguns momentos eu ainda sentia que tudo estava lento demais. Não sei se podem ter sido momentos que se revisados ficariam mais fluidos, mas teve horas que eu ficava “tá, vamos acelerar isso um pouco?! Tou lendo isso aqui e não parece que saí do lugar”, sabe?

O final é apressado e um pouco confuso. Tive a sensação que das 592 páginas, as 80 finais são pra resolver TODAS as pontas do livro. TO-DAS. É muito pouco “tempo” pra você organizar tudo na cabeça e não parecer que você tá correndo e jogando informação a torto e direito pra conseguir fechar o livro adequadamente, e com um gancho mínimo para o próximo livro.

E esse pode ser um spoiler, mas preciso deixar registrado que eu prevejo um triângulo amoroso para o segundo livro, e isso me dá uma certa preguiça. A autora já foi deixando dicas que Briana está apaixonada mas que tem outra pessoa que deixa ela muuuuito balançada. Aí já viu… Ela está mais próxima agora da segunda pessoa por motivos que você vai ter que ler, mas nossa!… todas as indicações de triângulo e com possibilidade de ela mudar de interesse em definitivo (se você leu A Saga do Tigre, da Colleen Houck, ou Estilhaça-me, da Tahereh Mafi, vai entender o que quero dizer).

Estou torcendo para estar errada, mas já estou com preguiça com antecedência. 😬

De qualquer forma, pra mim que andava sofrendo com YAs que não funcionavam, Lendários foi um ótimo achado e pretendo ler o próximo quando a autora e a Intrínseca lançarem! \o/


Linguagem neutra e inclusiva

Antes de tudo, vale falar que na ficha técnica do livro estão creditadas duas pessoas que foram responsáveis pela leitura sensível da história/tradução. Levando em consideração algumas polêmicas sobre escolha de palavras e representações que aconteceram num passado recente com outras editoras, achei bastante correto e elegante a Intrínseca se preocupar com a percepção do trabalho feito em Lendários.

Dito isso, quero comentar sobre linguagem neutra e inclusiva, mas com pouco conhecimento aprofundado de causa (e eu sei que isso é motivo pra gerar informações e opiniões vazias, não é mesmo?! Mas vou tentar não ser muito ignorante).

Como eu comentei, um personagem na história é não-binário, e nossa linguagem é naturalmente binária no gênero. A gente usa o feminino/masculino para identificar e definir as pessoas, falando Ela/Ele para indicar os personagens.

Tracy Deonn e a Intrínseca na sua tradução, usaram o neo pronome Elu para identificar o personagem não-binário ao longo da história e eu achei maravilhoso essa validação do movimento de trazer uma linguagem mais inclusiva para as pessoas que não se identificam com os gêneros binários.

Mas (por que tem que existir um sempre?) eu não achei que foi feito da melhor forma. Se você não está na “bolha” que sabe desse movimento da linguagem inclusiva e sugestão de mudança do gênero neutro pode ser muito confuso esbarrar com um Elu no meio da frase.

Até onde eu sei, e eu sei pouco e é minha culpa por não me informar e envolver mais com o assunto, toda essa questão de pronomes com que nos identificamos tem que ser de alguma forma apresentado para as pessoas. Se você não se identifica com o binário, você precisa se fazer compreendido em como gostaria de ser tratado apresentando seus pronomes.

Na página 114, onde Greer é apresentade para Briana e para o leitor, em nenhum momento isso é indicado. Briana automaticamente passa a tratar Greer por Elu sem que Greer tenha realmente dito que é assim que gostaria de ser tratade.

Eu queria muito que a editora tivesse feito uma nota explicando para o leitor sobre o neo pronome. Da forma como foi feito está tão naturalizado que para quem não conhece pode só ficar confuso porque Greer é Elu, ou até que foi um erro de revisão. Eu acho que a Intrínseca perdeu a oportunidade de, além de trazer essa normatização do neo pronome, ensinar e conscientizar os leitores que isso é uma nova proposta de linguagem que será respeitada quando trazida pelos autores.

Espero que para os xóvens essa passagem tenha sido uma leitura completamente natural, mas precisamos entender que todas as pessoas podem ter acesso ao livro, e quão mais inclusivo e instrutivo pudermos ser, vamos garantir que mais pessoas entendam e respeitem a diversidade em todas as suas formas.


Conversei com a editora e a resposta que me deram foi que como Tracy Deonn não foi didática no original, a Intrínseca decidiu respeitar a forma como foi feito pela autora e não colocar nenhum tipo de “nota do editor” para tratar a questão do pronome, realmente naturalizando a linguagem como foi proposto no original. 😉


Até a próxima! o/

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