resenha

Eu tenho um nome – Chanel Miller

6 abr 2021
Informações

Eu tenho um nome

Chanel Miller

Intrínseca

série ---

336 páginas | 2021

4.5

Design 4

História 5

16

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Ela ainda não era conhecida pelo próprio nome quando surpreendeu milhões de pessoas com uma carta relatando o estupro que havia sofrido no campus da Universidade de Stanford. Publicada no BuzzFeed, a declaração da vítima foi vista por onze milhões de pessoas em apenas quatro dias, traduzida para diversos idiomas e lida no plenário do Congresso americano, inspirando mudanças na lei da Califórnia e a demissão do juiz do caso. Brock Turner, o acusado, foi condenado em 2016 a apenas seis meses de prisão depois de ser flagrado agredindo-a sexualmente. Milhares de pessoas escreveram para dizer que ela lhes dera a coragem de compartilhar experiências de agressão pela primeira vez.

Agora Chanel Miller reivindica a própria identidade para contar sua história. Embora tudo apontasse para a condenação de Turner — havia testemunhas, ele fugiu, provas físicas foram imediatamente coletadas —, restou para Chanel apenas a luta contra o isolamento e a vergonha. Sua história lança luz a uma cultura que protege os agressores e expõe um sistema de justiça criminal falho com os mais vulneráveis, mas mostra também a coragem necessária para lutar contra a opressão e atravessar o sofrimento.

Ao entrelaçar dor e resiliência em seu relato, Chanel Miller revela seu tumultuado processo de cura e desafia uma sociedade que tantas vezes permite o inaceitável e ajuda a perpetuar uma cultura que desencoraja as vítimas de buscarem justiça. Além de apresentar uma escritora extraordinária, Eu tenho um nome é uma obra capaz de transformar para sempre a maneira como enxergamos os casos de agressão sexual.

Design

Essa capa, apesar da simplicidade, é carregada de significado.

Na segunda orelha do livro tem uma explicação que os veios dourados remetem a uma arte japonesa chamada kintsugi. Essa arte consiste em reparar peças de cerâmicas danificadas com uma mistura de laca e ouro, reforçando as junções das peças.

A ideia aqui é que mesmo que a peça não volte a ser o objeto original, ela continua sendo única.

Nada mais poderoso para representar a jornada de Chanel Miller nesse livro.

Fora isso, o miolo é o tradicional da Intrínseca, correto, equilibrado e com fonte legível e agradável pra essa leitura extremamente poderosa.


História

Em 2016 um artigo do Buzzfeed explodiu em leituras e compartilhamentos. Era o texto da declaração de Emily Doe para seu agressor, lido no dia da sentença no tribunal.

Era um texto sofrido, cru e passional sobre tudo que Emily Doe sofreu desde o dia que foi estuprada por Brock Turner.

Esse livro é sobre esses anos. Esse livro é a história do estupro, do julgamento e da tentativa de recuperação. Esse livro é sobre Emily Doe, que finalmente se apresenta como Chanel Miller e assume publicamente sua história e tudo o que sofreu até a publicação.

Então, se você tem gatilhos com estupro, cenas gráficas e descritivas de cenas de crime, julgamento, machismo, injustiça, representação de depressão e ansiedade, talvez essa não seja uma leitura indicada pra você.

Mas, caraca, como deveria ser uma leitura pra todos! E sim, poderia entrar na lista de livros que quase me fizeram chorar: de raiva, de empatia, de sofrimento.

Eu tenho um nome foi um livro difícil. Porque ele me fez ver que eu ainda tenho, incrustrado nas paredes da minha estrutura moral, a tendência a culpar a vítima. E eu me senti muito mal por isso.

Sabe, eu fui criada com uma mentalidade que homens tem a “liberdade” de fazer o que quiserem e nós mulheres temos que evitar a todo custo incitar os “desejos” masculinos.

Então, você tem que estar atenta o tempo todo. Você tem que tomar cuidado com o que veste. Você não deve sair à noite sozinha. Tem que tomar cuidado com o que diz e com o que não diz. Tem que tomar cuidado com o que bebe, nunca aceitar bebidas de estranhos, e sempre olhar seu copo. Na verdade, você não pode ficar bêbada.

Porque se você não fizer isso, você OBVIAMENTE está querendo.

E isso é toda a cultura do estupro e do machismo que eu fui criada pra acreditar que me “protege”.

Eu fui tolhida de diversas liberdades para poder me proteger dos homens. E fui ensinada que mulheres que não fazem ou não agem dessa forma, estão fadadas a serem estupradas, abusadas, bulinadas.

E eu confesso que são anos de trabalho mental para desconstruir essa minha “verdade moral”. Essa barreira que me separa “das outras”. Então você entende que eu levei 2 segundos para me dar um tapa mental quando li que Chanel Miller foi estuprada nos fundos de uma fraternidade de Stanford, atrás de caçambas de lixo, e não tinha memória de nada por estar bêbada.

Porque meu “condicionamento” automaticamente começa a montar o “está quer…” na minha cabeça, e eu tenho que ATIVAMENTE dizer pra mim mesma que NÃO. Ela não estava querendo. Ela não estava permitindo. Ela não estava disponível.

Eu tenho que ATIVAMENTE me lembrar que mulheres não são objetos que podem ser usados e descartados para os desejos de homens que acreditam que é para isso que nós servimos. Principalmente se estivermos em situação de vulnerabilidade.

Então o livro foi um desafio e um marco pra mim. E foi MUITO IMPORTANTE perceber o quanto ainda é difícil pra mim culpar exclusivamente e imediatamente o agressor. Mas eu juro que estou aprendendo. E mais do que tudo: eu quero mudar e melhorar.

Acompanhar os capítulos desse momento da vida de Chanel é sofrido. O primeiro é completamente dedicado ao dia do estupro. E ele é longo e pesado. E ele te destrói um pouco por dentro. E, o pior de tudo, ele é só o começo.

Porque depois de toda a humilhação que ela passa para a coleta de material para análise policial, as fotos, a invasão física que vem depois da invasão que o agressor já realizou, vem toda avalanche de negação, culpa, depressão.

Mas pra mim, o ponto mais pesado de tudo (e é muita coisa que acontece) foi o julgamento. Dá muito nojo do advogado de defesa de Brock Turner. Dá ainda mais nojo dele. Dá nojo da família dele. O que parece é que é uma família abastada, daquelas americanas brancas sentadas no seu trono de privilégio.

A tentativa de criar uma narrativa que favorecesse o estuprador montando uma imagem distorcida da Chanel é tão nojenta que é difícil passar pelas páginas. Cobrar dela detalhes minuciosos do dia do crime, como se para mostrar que, como ela não se lembra do que aconteceu, não é possível dizer que ela não queria estar atrás de uma lixeira, jogada no chão, sobre folhas de pinheiro, sendo dedada por um desconhecido.

E as justificativas de que o estuprador era uma rapaz cheio de potencial, de que Chanel está destruindo as oportunidades e o futuro dele…!

Cara.

CARA!

Eu surtei. Quando saiu o resultado do julgamento e a sentença final eu não aguentei. Tanto que avisei nos stories do Instagram que eu ia dar um tempo. Porque a impressão que deu é praticamente ele saiu impune do crime, com apenas um “arranhão”, um deslize, na vida perfeita que estava traçada pra ele. Uma palmadinha na mão porque fez algo errado.

E eu fiquei realmente irritada com isso. De que pro juiz, o agressor era realmente um “tadinho”.

Depois da pausa na leitura, finalizei o livro com um pouco mais de “justiça” porque Chanel consegue algumas reviravoltas na proteção de vítimas de estupro, de penas mais efetivas para esse tipo de crime, de afastamento desse juiz. Eu me pergunto se ela tivesse pego uma juíza teria feito alguma diferença.

Mas ainda assim, vendo que Chanel conseguiu sobreviver e talvez começar a se erguer e se recuperar é uma recompensa pequena quando comparado a toda a jornada, sabe? Traz satisfação, mas ainda assim, pessoas ainda são estupradas. Mulheres ainda são violadas e desrespeitadas. E isso mata a gente por dentro.

E isso destrói a esperança na humanidade que a gente já não tem.

Esse livro é muito importante. Ele me mostrou que eu ainda tenho um longo caminho pela frente. Eu e toda a sociedade que ainda coloca a culpa na vítima.

Desculpe, mas essa resenha não tem um final feliz nem uma resposta de “tudo vai ficar bem”. Só tem aquela pequena esperança que mais pessoas possam ser impactadas pela história de Chanel Miller e possam começar a se questionar o que deu errado com a humanidade.

O mais triste nesses casos, além do crime em si, são as coisas degradantes nas quais a vítima começa a acreditar sobre ela mesma. Minha esperança é mudar essas crenças. p.6


Eu fiz diversas marcações no livro conforme fui passando as páginas, mas eu confesso que não quero voltar e reler o sofrimento. Não quero povoar essa resenha com citações que podem se perder da força da narrativa de Chanel Miller.

Então eu convido você a mergulhar na vida dessa mulher e fazer suas próprias marcações. Identificar o que ressoa e o que te choca no relato desses anos que Chanel teve que passar. E quem sabe, depois vir dividir comigo o que você achou da experiência.


Até a próxima! o/

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