resenha

Em Águas Profundas – Patricia Highsmith

3 mar 2021
Informações

Em Águas Profundas

Patrícia Highsmith

Intrínseca

série ---

304 páginas | 2020

4.25

Design 5

História 3.5

16

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Vic e Melinda estão longe de ser um casal feliz ― seu casamento é mantido por um acordo nada convencional: Melinda pode ter quantos amantes quiser contanto que não arraste os dois e a filha para o caos de um divórcio. Tudo parece bem, mas, com o passar do tempo, Vic começa a se incomodar com os homens escolhidos pela esposa e adota uma estratégia inusitada para afugentá-los, assumindo a autoria do assassinato de um deles. Só que a notícia se espalha por toda a cidade do interior dos Estados Unidos e o antes cidadão-modelo, benfeitor, marido mais do que tolerante e empreendedor abnegado vira alvo da maledicência de todos.

Tudo levava a crer que a vida voltaria ao normal quando o verdadeiro assassino é descoberto, mas a revelação da mentira de Vic é o estopim de uma reviravolta nas convicções do próprio e nas relações que mantém com a comunidade, com os amigos e com Melinda e seus vários amantes. O que se cria é uma trama intrincada, repleta de segredos, manipulação psicológica e sangue.

Em águas profundas tem a marca registrada de Patricia Highsmith: explora os abismos mais sombrios da psique humana e lança luz para o fato de que sob a superfície das personalidades mais pacatas e exemplares podem se esconder as mais sórdidas psicopatias

Design

Existem 2 coisas que eu simplesmente adoro no design gráfico de capas: ilustrações bonitas e tipografia.

Fazer uma arte de capa totalmente tipográfica é uma coisa que eu adoro e acho altamente instigante (quando bem feita). É um deleite maravilhoso ver (e ter) algumas das capas da Intrínseca porque elas tem esse trabalho mais intrincado com tipografia.

Pode parecer mais “fácil” ou “simples” de criar uma capa só com tipos, mas na verdade tem toda uma questão de hierarquia, ocupação de espaço, volume dos vazios que você tem que equilibrar pra gerar a arte em si. Fora que tem também toda a participação que a escolha de cor vai fazer junto com o tipo.

Aqui, com essa capa metalizada, você consegue se sentir afundando “em águas profundas” com o suave degradê das fontes e o “furtacor” que o efeito metálico dá pra capa. 🤩

Fui procurar e a Intrínseca contratou um designer especializado em arte tipográfica pra criar as capas dos livros da Patricia Highsmith, e assim ter uma identidade única pra autora. Super aprovo esse tipo de decisão editorial, principalmente quando o resultado é um livro como Em Águas Profundas (e os outros livros da autora quando saírem).

Aí, você abre o livro e toda essa ambientação aquática te acompanha com uma imagem na guarda do fundo de uma piscina!

E o estilo tipográfico também permeia todo o projeto gráfico do miolo, não só na folha de rosto, mas todas as numerações de aberturas de capítulo são trabalhadas com essa combinação de linhas verticais pronunciadas e os algarismos.

Belíssimo!


História

Umas das coisas que eu achei “estranho” em Em Águas Profundas é que não tem bem uma história. São 304 páginas que você não tem muito de desenvolvimento da narrativa em si, como se “nada estivesse acontecendo”.

Acho que muito disso vem da sensação de slice of life que a história de Vic e Melinda tem. É um recorte de um momento da vida de um casal. Talvez de seus momentos finais, mas ainda assim, parece um tempo curto pra realmente aprofundar na história.

Mas é aí que tá. De certa forma, o importante não é o que está acontecendo na história, mas o que está acontecendo com os personagens. Em Águas Profundas é uma história completamente character driven, mais especificamente da “descoberta” de Vic, o protagonista.

Vic e Melinda não são um casal tradicional. Juntos há praticamente 10 anos, eles tem um acordo. Melinda pode ficar com qualquer homem que quiser, e eles mantém a relação como se tudo estivesse normal.

E isso é tãaaaao estranho…

Assim, se a gente pensar na época em que o livro foi lançado, em 1957, toda essa coisa de divórcio não devia pegar bem pra ninguém. Imagina em cidades “pequenas” do EUA, em que a imagem é tudo pra sociedade que vive e convive e sabe de tudo de todos. Talvez fosse mais cômodo pro casal assumir esse tipo de relacionamento “aberto” do que entrar num processo de separação.

Mas ainda assim. Bizarro.

Só que ao mesmo tempo, é exatamente essa situação que constrói toda a tensão e desconforto da história. Porque da forma como Patricia Highsmith cria e apresenta seus personages, você fica com pena de Vic e com rancor de Melinda.

Porque Vic é o homem amoroso, provedor, pai dedicado, e que abre mão de sua felicidade para que Melinda possa ser “livre” pra fazer “das suas”.

E Melinda parece uma mulher descontrolada, que não sabe refrear seus impulsos, e que não respeita o acordo com Vic, porque não satisfeita em ter relacionamentos fora do casamento, ela ainda força a convivência de seus namorados com sua família e amigos.

(Vale um parênteses para comentar que Vic e Melinda dormem em cômodos diferentes da mesma casa, ela no quarto principal e ele no quarto da garagem. Então imagina a situação de você estar em casa, com sua filha, e sua esposa estar esperando você ir dormir pra levar o amante, que já jantou com vocês, pro próprio quarto?!)

Patricia Highsmith me fez sentir nojo de Melinda, e eu me senti desconfortável com isso. Do mesmo jeito que me senti desconfortável por ficar “do lado” de Vic. Não só pela “sororidade” da coisa toda, mas porque os personagens são difíceis de você realmente gostar.

A gente começa a acompanhar o livro com Melinda já tendo um histórico de relacionamentos. E ela trata mal Vic, ignora e é ausente com a filha, e a gente ainda tem a sensação que os amigos pessoais do casal aturam a mulher por conta de Vic, mas ninguém realmente parece gostar dela.

Aí acontece o que a sinopse conta. Vic passa a querer assustar os namorados da esposa. Ele conta pra mais recente aquisição que matou um dos casos anteriores. Simplesmente porque o assassinato não tinha sido resolvido, e era interessante ver como namorado reagiria a uma ameaça velada, mas direta, de Vic.

De certa forma, isso acaba se espalhando pela pequena cidade, e Vic não parece ficar tão preocupado com possíveis repercussões. A não ser pelo fato de Melinda surtar de que ele estava sendo terrível ao assustar os namorados.

Até que o verdadeiro assassino é encontrado, e Melinda se vê “livre” novamente para arranjar um novo caso. E novamente a gente tem que ficar angustiado com a passividade de Vic e o descaso de Melinda.

E isso vai mexendo com o leitor de uma forma estranha. Uma vontade de pedir pra Vic tomar uma atitude. Porque obviamente Melinda não ama o marido e é uma falta de respeito todo esse relacionamento.

Até que ele toma uma atitude. E você fica meio em choque do tipo “caramba… mas aí foi meio drástico, não é mesmo”. E você passa a ter um conflito interno porque, você não sabe mais se torce pro Vic, mas não quer a Melinda na vida da família, mas o Vic não é lá uma pessoa pra se torcer também, mas a Melinda continua sendo insuportável…

SOCORRO!

Sabe Dexter? A série do psicopata? Que você se sentia emocionalmente envolvido com o protagonista, mesmo sabendo que o que ele fazia era errado, mas tinha uma “desculpa moral” pra ser aceito?

Pois é. Foi meio como me senti aqui. Não foi bom, porque você se manter nessa zona cinza de morais que podem ser dobradas de acordo com a circunstância é muito desconfortável. Faz você se questionar algumas coisas internas também, e a gente nem sempre quer mergulhar nas águas profundas da nossa mente, não é mesmo?

Diferente de um thriller em que você tem que solucionar um mistério, e que normalmente é saturado de ansiedade e tensão pela resolução do caso antes do próximo assassinato/desaparecimento/ou afim, aqui a tensão e a angústia vem um pouco do dia a dia “comum” e da pressão social de como as coisas são na vida de Vic.

Um pouco sobre o ritmo da Patricia Highsmith. A narrativa é bem lenta até o primeiro momento de “caraca!”, mas depois ela pega um ritmo mais interessante, porque você fica na tensão do “e agora?!”.

No fim das contas o livro termina num certo anticlímax estranho e você se sente um pouco perdido do tipo “vai terminar assim mesmo?”. Mas a jornada de acompanhar a descoberta pessoal do Vic meio que ajuda a valer a pena.


Até a próxima! o/

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