Coraline
Intrínseca
série ---
224 páginas | 2020
Certas portas não devem ser abertas. E Coraline descobre isso pouco tempo depois de chegar com os pais à sua nova casa, um apartamento em um casarão antigo ocupado por vizinhos excêntricos e envolto por uma névoa insistente, um mundo de estranhezas e magia, o tipo de universo que apenas Neil Gaiman pode criar.
Ao abrir uma porta misteriosa na sala de casa, a menina se depara com um lugar macabro e fascinante. Ali, naquele outro mundo, seus outros pais são criaturas muito pálidas, com botões negros no lugar dos olhos, sempre dispostos a lhe dar atenção, fazer suas comidas preferidas e mostrar os brinquedos mais divertidos. Coraline enfim se sente… em casa. Mas essa sensação logo desaparece, quando ela descobre que o lugar guarda mistérios e perigos, e a menina se dá conta de que voltar para sua verdadeira casa vai ser muito mais difícil — e assustador — do que imaginava.
Publicado pela primeira vez em 2002, Coraline foi o primeiro livro de Neil Gaiman para o público infantojuvenil e se tornou uma das obras mais emblemáticas do escritor. Repleta de elementos ao mesmo tempo sombrios e lúdicos, a história conquistou crianças e adultos em todo o mundo e, em 2009, ganhou as telas de cinema em uma animação dirigida por Henry Selick, de O estranho mundo de Jack. Nesta edição especial em capa dura, com introdução do autor e projeto gráfico exclusivo, coube ao renomado ilustrador Chris Riddell dar vida ao universo mágico e aterrorizante criado por Neil Gaiman.
Design
Ah, os projetos gráficos da Intrínseca! 💖
Quando a editora se dedica a um livro, ela faz com um esmero que dá gosto e satisfação de ter um exemplar. Ainda mais quando é um livro que pode ser um favorito de uma criança e ser manuseado constantemente.
Eu simplesmente adorei esse projeto gráfico. A ilustração da capa, que extravasa para a quarta-capa, mostra os principais elementos da história, já preparando o clima e nosso relacionamento com os personagens.
E o padrão cromático é deliciosamente frio, com essas cores basicamente em tons de roxo e verde, com um amarelo ocasional para criar contraste.
Achei interessante o peso quase igual do título do livro e do autor. Tanto Coraline quanto Neil Gaiman tem um peso crucial pra convencer o leitor a levar o livro pra casa.
E o símbolo da Intrínseca!! Editado pra ficar com um botão no lugar do pingo do I!! Uma pequena sutileza que faz toda a diferença na integração da editora com seu livro.
O livro é em capa dura, daqueles que tem fitilho pra te ajudar a marcar a página. Eu ainda assim uso marcador, mas já é uma forma de ajudar quem não tem o costume de usar.
O lindo aqui também é que o roxo da ilustração da capa invade todos os elementos físicos do livro, indo parar no fitilho, na pintura trilateral, nas folhas de guarda, e em TODAS AS ABERTURAS DE CAPÍTULO.
Você nunca teve tanto roxo em sua vida! 🤣
Falando do miolo, a fonte é um pouco “grande”, mas faz sentido em um livro editado para crianças e, dentro da mancha da página, ela fica bem elegante.
Todos os capítulos são ilustrados na abertura, com uma cena importante da história pra você se sentir inspirado durante a leitura.
Definitivamente, Coraline entra pra lista dos livros mais bonitos do ano.
História
A gente às vezes elege alguns autores como aqueles que queremos conhecer o máximo de obras possíveis.
Neil Gaiman é um desses autores pra mim. Estou me esforçando pra comprar tudo que ele produziu? Não muito, principalmente porque os encadernados de Sandman são meio muito caros. Mas ainda assim, ele é um autor de quem eu gosto de ir atrás quando consigo.
Devo ter comentado em alguma resenha anterior do autor que minha primeira experiência com ele (sem saber o quanto ele era importante) foi com a HQ Morte: O grande momento da vida.
E de certa forma, aqui em Coraline eu encontrei um pouco do valor que a Morte queria dar pra vida e pras pessoas com quem a gente se relaciona.
Minha primeira experiência com Coraline na verdade não foi com o livro. Há algum tempo eu tentei ver o filme em stop motion. Esse é um gênero de “animação” que eu acho surpreendente, e como era uma história do Neil, fiquei ainda mais interessada.
Só que não funcionou muito pra mim. Tanto que eu dei umas cochiladas e desisti de ver. Eu acho que estava esperando uma aventura e fantasia estilo A Viagem de Chihiro, e não foi bem isso que encontrei no filme.
Mas é engraçado como são as coisas. O livro foi tão mais interessante e envolvente! Às vezes, quando uma obra é adaptada pra outra mídia, ela pode ter uma camada de interpretação diferente do original.
Não sei dizer se isso é ruim. Mas faz com que ela se torne um outra coisa. E nem sempre essa “outra coisa” ressoa com a gente como a obra original deveria.
De qualquer forma, Coraline me conquistou de uma forma que eu não esperava. Talvez porque eu tenha ficado com um “gosto ruim” da personagem do filme, descobrir uma Coraline diferente foi super agradável.
Como é um livro infanto-juvenil, não existem tantos plots ou subplots sendo desenvolvidos aqui. Mas isso não faz com que a jornada de Coraline não seja relevante ou menos importante.
Primeiro porque é uma jovem protagonista com a responsabilidade de salvar os próprios pais. Segundo porque a principal mensagem da história é que ser corajoso não é não ter medo.
Ser corajoso é ter medo, e ainda assim, fazer o que é preciso.
– Porque coragem é quando você sente medo de fazer algo, mas faz mesmo assim, é quando você enfrenta o medo – respondeu ela. p.90
Coraline e seus pais acabaram de se mudar pra uma nova casa. Parece ser um daqueles “condomínios” ingleses de várias casas/apartamentos conjugados.
A escola ainda não começou e Coraline está entendiada. Seus pais trabalham em casa, mas não tem muito tempo para dedicar pra criança.
Coraline tentou entender por que os adultos quase nunca falavam algo que fizesse sentido. Às vezes ela se perguntava com quem eles achavam que estavam conversando. p.39
O que provavelmente reflete muito a realidade que a gente está vivendo nesse momento, com a quarentena e várias famílias aprendendo a conviver realmente 24/7 juntos.
Na casa nova existe uma porta estranha que quando aberta leva para uma parede de tijolos. Quando a mãe de Coraline abre essa porta, ela explica que provavelmente levava para o apartamento conjugado.
Tentando se manter entretida, Coraline pega a chave da porta e quando a abre, não é mais uma parede de tijolos que ela encontra, mas um longo corredor.
Em busca de uma aventura, a menina atravessa a porta e, ao fim do caminho, encontra um reflexo da sua casa do outro lado. Inclusive versões de sua mãe e de seu pai que, aparentemente, são completamente dedicados e interessados em Coraline. Eles só querem amá-la, e enchê-la de tudo o que ela sempre quis.
Mas esses outros pais são estranhos. Seus olhos são botões!
Coraline decide voltar para sua casa, mas descobre que seus verdadeiros pais desapareceram e é sua responsabilidade, e de um gato que surgiu para apoiá-la, de regatá-los das garras da Outra Mãe.
– Gatos não têm nomes – disse ele.
– Não?
– Não. Vocês, pessoas, têm nomes. É porque vocês não sabem quem são. Nós sabemos quem somos, então não precisamos de nomes. p.65
Eu confesso que, do alto dos meus quase 40 anos, ainda fiquei com um certo receio/medo enquanto passava pelas páginas de Coraline. Ao mesmo tempo que eu me agarrava à coragem dessa pequena heroína, era quase aterrorizante algumas tarefas e situações que ela teve que superar para conseguir voltar para casa com sua família.
Além disso, as ilustrações que acompanham os capítulos vão dando o tom de o quanto Coraline está cada vez mais em uma situação complicada e arriscada no outro mundo.
Acho que uma das coisas que eu também percebi na história é o quanto deve ser difícil enfrentar uma criatura que emula em praticamente tudo as pessoas que você mais confia na vida quando é uma criança. Óbvio que todos nós, em algum ponto, descobrimos que nossos pais são pessoas “normais” e tem falhas como a gente.
(…) Era verdade: a outra mãe a amava. Mas amava como um avarento ama o dinheiro, ou um dragão ama seu ouro. Aos olhos da outra mãe, Coraline era uma posse, nada mais. p.154
Mas quando você é pequeno e seu maior exemplo de proteção e confiança são seus pais, imagina você ter que enfrentar exatamente essas pessoas só que de alguma maneira deformadas para serem quase pesadelos?
Exige coragem enfrentar esse tipo de desafio.
Neil Gaiman escreveu esse livro para suas filhas. E eu achei que essa história é uma forma maravilhosa para mostrar para nossas meninas e meninos sobre coragem, determinação e autonomia.
Outros livros do autor
Até a próxima! o/
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