resenha

Contato de Emergência – Mary H.K. Choi

25 nov 2019
Informações

Contato de Emergência

Mary H.K. Choi

Intrínseca

série ---

336 páginas | 2019

3.75

Design 4

História 3.5

16

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Essa é a história de Penny e Sam.

Ela tem dezoito anos e acabou de sair de casa rumo à universidade. Longe da mãe expansiva e do namorado sem graça, vai finalmente se dedicar ao sonho de ser escritora. Só não contava que essa nova vida traria também novos obstáculos: pessoas, o maior pesadelo de qualquer introvertido.

Ele, por sua vez, está perdido na vida. Em todos os níveis. Aos vinte e um anos, os poucos dólares na conta, a mãe alcoólatra e a ex-namorada complicada não o ajudam a se manter são. Só lhe resta fazer os doces mais mirabolantes para o café onde trabalha (e mora), concluir sua faculdade a distância e tentar (sem muito sucesso) não surtar.

Por um acaso do destino — também conhecido como um ataque de pânico no meio da rua —, eles passam a trocar mensagens de texto inofensivas. Mas o que começa como um simples contato de emergência salvo no celular se torna a conexão mais importante da vida deles.

Aos poucos, esses jovens introvertidos e problemáticos se tornam dois amigos dividindo angústias, sonhos, piadas e inspirações. Duas pessoas que quase nunca se veem, mas que estão juntas o tempo inteiro. Dois solitários que, finalmente, não estão mais sozinhos.

Com perspicácia, humor e grande sensibilidade, a estreante Mary H. K. Choi traça o retrato de uma geração cujos relacionamentos se entrelaçam à evolução tecnológica. Uma história capaz de causar nos leitores o frio na barriga que só as melhores comédias românticas podem proporcionar.


Design

Eu simplesmente ADOREI a ilustração da capa desse livro. Entre uma foto de casal e uma ilustração, eu SEMPRE vou valorizar mais o desenho. Ponto.

De alguma forma, fotos de pessoas reais começou a ficar um pouco “banal” na capa de livros, sabe? Então uma ilustração que me lembra um shoujo manga foi um jeito diferente e muito bonitinho de montar essa capa.

O padrão cromático também ajuda a dar uma certa suavidade e leveza pra capa. Esse rosa pastel fazendo um certo contraste com o desenho em preto. A moldura branca dando um contorno pra capa como um todo. E o hot stamping dourado no título e no ponto da marca da Intrínseca são todo o charme que a gente precisa pra ficar feliz com o livro.

Na quarta-capa, a gente já tem uma amostra de como os diálogos “digitais” de Penny e Sam vão ser mostrados no miolo do livro. Só que eu particularmente não curti muito. u.u

contato de emergência - quarta capa

Tá vamos falar logo sobre essa questão da representação do “whats app” no livro. Eu não tenho como dizer como “todo mundo” escreve no aplicativo, mas a “tendência” é que você tenha diversos balões com frases curtas.

A representação mais próxima para isso não era aglutinar as falas de cada personagem num balão gigante. Era manter cada frase em um balão menor individual. Isso me incomodou bastante, sabe? Porque, se a intenção era emular uma realidade que vemos todos os dias, passou bem longe do que a gente experimenta em nossos próprios celulares.

Fora isso, eu gostei bastante da diagramação do livro. Os capítulos alternam entre Sam e Penny e são nomeados logo no começo para sabermos de quem é a vez. Ao longo das páginas tem esses momentos de “whats app” em que os personagens conversam através de mensagens, mas a maior parte ainda vai ser de blocos de textos normais.

Projeto gráfico correto e bonito, com boa legibilidade e ocupação da mancha gráfica nas páginas do livro. <3


História

Acho que já deu pra perceber que eu tenho um certo problema com romances contemporâneos. Principalmente se eles forem YA. Mas, de vez em quando, um livro do gênero consegue me agradar (o Goodreads disse que é YA, então vou assumir que estou certa em achar que o livro tá dentro do gênero).

(…) Amar alguém era traumatizante. Nunca se sabia o que poderia acontecer com a pessoa solta no mundo. Tudo o que era precioso era também vulnerável. p.322

Foi uma super aventura a leitura de Contato de Emergência? Não é pra tanto. Mas foi divertidinho acompanhar as idiossincrasias de Penny e a suave depressão de Sam.

Principalmente porque Penny quer ser escritora. Então, em muitos momentos o livro é quase metalinguístico ao falar sobre construção de personagens e tipos de narrativas, por exemplo.

Uma protagonista feminina tornava as histórias mais inspiradoras do que voyeurísticas. Era tão mais divertido escrever sobre quem você poderia ser. (…) Bastava escrever exatamente como se escreveria se o personagem fosse um cara, mas aumentando a tolerância à dor, já que garotas têm que aguentar mais coisas no mundo, e dar às personagens mais empatia, o que torna tudo mais arriscado. p.73

Penny é uma jovem adulta com muitos problemas com a mãe solteira. Ela se sente responsável pela mãe aparentemente irresponsável. E da forma como a autora escolhe apresentar o relacionamento materno, eu total entendo a necessidade de Penny desaparecer do convívio familiar.

Parêntesis gigante aqui para comentar sobre como a cultura familiar americana, que é normalmente mostradas nas obras literárias e cinematográficas, estimula esse desapego dos membros da família. Os pais não veem a hora de se “livrar” dos filhos quando eles vão para a faculdade. E os filhos não veem a hora de conquistar uma independência do controle dos pais.

Até onde eu entendo, aqui no Brasil nós ainda temos esse costume de só sair de casa quando casamos. Existe uma co-dependência pais/filhos muito grande, que eu acho que vai além do fator de conforto financeiro… Vai entender?

Fechando o parêntesis. Penny tem mommy issues.

(…) às vezes essas pessoas se tornam pais ou mães por acaso. Além da biologia envolvida. Elas não passam por um teste nem nada, não exigem que elas demonstrem conhecimentos específicos para cuidar de alguém. Às vezes, as pessoas são realmente idiotas. Com certeza mais burras do que você, mas, como filho, você nunca percebe isso. p.287

Na verdade, um dos grandes plots aqui pode ser considerado mommy issues. Porque Sam também tem problemas sérios com a mãe. Só que, diferente de Penny, que vem de um lar semi-estruturado e financeiramente confortável (ela ganha um iphone no começo da história), a mãe de Sam é alcoólatra, meio que o expulsou de casa, e já sujou o nome do filho com o “serasa” inúmeras vezes.

Bem, Penny e Sam começam suas histórias cada um em seu canto introspectivo e levemente emo. Penny indo para faculdade numa cidade próxima e Sam fazendo o impossível para conseguir pagar por uma faculdade comunitária.

Penny tem um namorado bem nojentinho e Sam está tentando se recuperar de um relacionamento abusivo. Sério. A menina que ele namorava realmente mantinha o cara numa situação de capacho. Dá bastante raiva.

Mark falava sobre o próprio pênis na terceira pessoa. Penny achava que era a forma menos romântica possível de se referir ao dito-cujo e, cada vez que “ele” era mencionado, ela imaginava um pênis de óculos escuros, chapéu e paletó. p.117-118

A forma que eles passam a realmente interagir, e o que dá nome ao livro, é quando Penny encontra Sam tendo um ataque de pânico na rua. Os dois trocam número de celular e passam a trocar mensagens, que vão digitalmente aproximando os dois.

Só que esse contato de emergência é mantido em segredo de outras pessoas. A colega de quarto de Penny já foi “sobrinha” de Sam quando a mãe dele casou com o avô dela. Alguma loucura de parentesco que se você ler provavelmente vai entender. E a regra que ela deixa claro é: ninguém pode se relacionar com Tio Sam.

A construção do relacionamento dos dois, da troca de segredos que eles têm, coisas que nunca contaram pra ninguém, é muito bonitinha de acompanhar. Ver a cumplicidade e confiança crescendo entre eles; o interesse romântico; é daquelas coisas gostosinhas que dá pra ler de vez em quando.

E o bom é que, por mais que inicialmente Penny tenha dificuldade pra se relacionar com as outras mulheres que aparecem na história, não existe uma real disputa ou slut shame entre elas.

Individualmente, os desafios e crescimento que Penny e Sam passam ao longo da história também são legais de acompanhar. Tem angústia? Sempre tem que ter pra te manter interessado, mas aqui, pode ser previsível e tudo, mas pelo menos eu achei um pouco aceitável.

– Você é uma flor rara. (…) E tudo bem. É bom ter padrões elevados. O que me preocupa é que você também se submete a esses padrões. É dura demais consigo mesma. Tanta análise, reflexão e planejamento estão impedindo você de viver. Aproveite o presente, Penny. Não afaste as pessoas. p.319

Agora, vamos falar sobre um assunto que foi um tanto quanto complicado pra mim em Contato de Emergência.


Tá, preciso dizer que teve uma coisa que me decepcionou um pouco e isso vai ser um spoiler então, você pode fechar a resenha agora se não quiser ler sobre.

Mary H.K. Choi usa a “carta” do estupro na adolescência como um dos motivos para a construção da personalidade introspectiva, “misteriosa”, e até mesmo um pouco fria e distante de Penny.

Foi um acontecimento ULTRA importante e definidor na vida da garota e ela NUNCA contou para ninguém. Não denunciou o estuprador, que era uma pessoa que ela conhecia e frequentava a casa dela. Não falou para a mãe.

E foi um acontecimento que moldou a forma como ela se relacionou com o namorado e como ela enxerga o sexo. Penny entende que ela deveria ser uma jovem “saudável” e interessada em sexo, mas não consegue.

Da única vez que tentou ter relações com o ex-namorado, ela travou e começou a chorar.

Ou seja. É uma parada GRANDE na construção da personagem.

SÓ QUE no fim das contas ficou parecendo que a autora usou a “carta” do estupro só como um plot device para mostrar como Penny é “quebrada”, traumatizada e desconfiada.

“Vou jogar esse assunto mega polêmico aqui. Vou descrever como foi a cena e como a personagem se sentiu. Vou chocar e revoltar o leitor, mas não vou fazer com que Sam fique realmente revoltado ou que demonstre de verdade o quão errado foi isso tudo. E no fim das contas, vou juntar os dois e terminar o livro sem nem ao menos tocar no assunto de novo, ou pelo menos me preocupar em como os dois vão superar qualquer trauma que Penny possa ter.”

Acho que deve ter sido isso que passou pela cabeça da Choi quando ela estava escrevendo o capítulo em que Penny conta pra Sam quando foi estuprada.

Eu fiquei muito decepcionada em que o tema tenha virado só uma desculpa para jogar um assunto polêmico/sensível. Da forma como foi feito não acrescentou em praticamente nada ao desenvolvimento ou crescimento da personagem. Nem o fato de Penny não saber se era “sua culpa” foi usado como forma real de conscientização pro leitor. É tudo muito superficial na forma como é tratado (ou nem tratado) depois que é trazido pra história.

De certa forma, toda a parte conclusiva do livro é um tanto superficial. Todo o relacionamento de Penny e Sam é deixado em aberto, e a história fica parecendo que foi um grande “início” de uma “vida juntos”.

Acho que tem um pouco a ver com a minha leve repulsa a livros “totalmente em aberto”, mas eu preferia que houvesse um pouco mais de indicação se Penny conseguiu entregar os textos da aula de escrita criativa, se o relacionamento com o outro colega asiático ficou de boas, como ela se relacionou com a colega de quarto depois de Sam entrar oficialmente em suas vidas, se Sam conseguiu publicar o documentário que estava produzindo.

A sensação que eu tive é que várias coisas foram iniciadas mas, ou foram esquecidas ao longo do caminho, ou eram tão sem importância real pra trama que não precisaram ser resolvidas…


Ainda assim! Eu curti Contato de Emergência. A angústia romântica aqui, fora todos os problemas, é legal de acompanhar. Só pra variar, eu recomendo a leitura, se você não tiver gatilhos com o assunto do spoiler! ^.~


Até a próxima! o/

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3 Comentários

  • Responder Izandra 25 nov 2019 at 16:50

    Sam, de boa: acho que você está escolhendo YAs contemporâneos “errados” para ler xD

    Toda vez que você coloca um aqui, indicando ao menos uma tentativa de ler esse gênero, percebo que você tenta, talvez, fugir do que seria o “clichê” – mas acho que ainda não entendeu que o gênero é para SER clichê – e o que foge dele, acaba sendo ruim xD

    Não, sério, acompanha a lógica: se uma pessoa gosta de conto de fadas, é porque ela quer ler aquilo que faz ser um conto de fadas. E se alguém intitula algo de “conto de fadas”, mas faz diferente, desvirtuou tanto que saiu do gênero.

    Bom, os YAs que você escolhe para ler são, em parte, assim. Muito problemáticos, tentando levantar outros assuntos e, assim, fugindo do que seria o YA. Daí, não sei se você está “trapaceando” (tentando ler e não ler YA ao menos tempo), ou se realmente tá dando azar rs

    Se for o “trapacear”, também entendo: porque os YAs “puros” seriam os que estão para uma faixa etária abaixo da nossa, e já não temos paciência para ler. Nesse caso, sugiro que tente ler NAs: mesmos clichês românticos, mas, em tese, com um pouco mais de maturidade pelos personagens ;)

    • Responder Samara Maia Mattos 25 nov 2019 at 17:31

      Você tem TODA A RAZÃO. Acho que eu simplesmente não consigo (ainda) parar de tentar procurar uma coisa nos YAs que obviamente não vou achar no gênero.
      A questão dos NAs é que eu tenho a sensação que o hype deles já passou. Das editoras que acompanho, não tenho visto tantos lançamentos do gênero, e é mais fácil encontrar em e-books em inglês.
      Não falando necessariamente desse livro, mas o problema é que eu acabei acumulando YAs ao longo do tempo. Esse monte de trilogias que saíram, sabe? Tá tudo esperando a vez de ler. Ou seja, nunca me livrarei dos YAs. XD
      Mas vou tentar seguir sua sugestão. Parar de trapacear e procurar leituras mais dentro da minha faixa etária. :P
      Só não quero ler Melancia e agregados.

      • Responder Izandra 25 nov 2019 at 17:39

        Menina, pior que é. Quando tô afim de ler um clichê (geralmente, romance NA contemporâneo), procuro em inglês mesmo. Acompanho a J. Sterling (e tem vários no Kindle Unlimited), e mando bala em algum livro dela rs
        A hype brasileira parece ter passado… Dos romances de época também, acho (esses, nem eu tenho mais paciência pra ler).
        E, por favor, fuja de “Melancia” : chato PRA CARAIO. E seria chick lit xD
        Por falar em chick lit, sei que também deu azar, então, fica uma sugestão de procurar algo da Sophie Kinsella, que NÃO seja Becky Bloom; tem o “minha vida (não) tão perfeita” que é bem divertidinho, ou “fiquei com seu número”, ou “o segredo de Emma Corrigan” (que também virou filme, ainda não lançado no Brasil) ; todos valem a pena dentro do gênero ;)
        E pelo amor, abdica dessas trilogia YAs do qual já não temos idade pra ler; você vai se torturar desnecessariamente xD

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