Uma magia destilada em veneno
Galera
série Os livros do chá #1
336 páginas | 2022
Filha de um médico e de uma mestre da arte Shénnóng, Ning estava conformada com o arranjo familiar em que seguiria os passos do pai enquanto a irmã, Shu, seguiria os da mãe. Mas quando um chá envenenado leva sua mãe à morte e adoece gravemente sua irmã, os desejos secretos do coração de Ning se misturam à busca pelo antídoto que salvará Shu.
A jornada de Ning a leva até o palácio, onde será realizada uma competição para escolher o novo mestre Shénnóng da corte. O prêmio? Um pedido concedido pela própria princesa. Desesperada para salvar Shu, Ning vê na competição sua única alternativa e, mesmo não sendo a aprendiz da mãe, decide arriscar se passar pela irmã para competir. O que ela não imaginava é que as políticas da corte poderiam ser mais perigosas do que o chá envenenado que vem assolando todo o império de Dàx?
Agora, Ning está sozinha na capital e cheia de segredos que podem não só eliminá-la da competição como condenar sua família a um destino terrível. Além disso, ainda precisará provar suas habilidades no preparo de chás com propriedades lendárias enquanto se vê cada vez mais envolvida nas intrigas da corte, as provações cada vez mais perigosas da competição e os falsos aliados que podem pôr em risco seu objetivo de salvar Shu — e a própria vida.
Opinião
Eu não sei se já consegui retomar o ritmo e a dinâmica de escrever resenhas. Fiquei tanto tempo afastada dessa “função” que eu tenho a sensação que algumas coisas estão enferrujadas entre o que está na minha cabeça e o que eu passo para o teclado.
De qualquer forma, isso não me impede de continuar tentando.
A primeira coisa que me chamou a atenção em Uma magia destilada em veneno foi a capa. É humanamente impossível ficar indiferente a essa ilustração. Fui atrás pra ver outros trabalhos de Sija Hong, que é a responsável por essa maravilha. Vale muito a pena visitar o site e portfolio da artista.
Ela foi a capista de diversos livros de temas asiáticos que andaram saindo nos últimos tempo. Então é provável que você esbarre em outras ilustrações que ela tenha criado para esses universos únicos e belíssimos que finalmente estamos tendo a oportunidade de conhecer.
Depois fui ver sinopse. Normalmente, eu costumo olhar o Goodreads pra avaliar como andam as reviews de um livro por lá e eu tendo a dar atenção pros que tem notas acima de 3,7⭐. Sim, sou exigente. O que eu menos tenho é tempo pra gastar com livros que a “maioria” deu notas que nem chegam a 3,5⭐.
E sim, a história me chamou a atenção. A ideia de existir uma “classe” de pessoas que tem a capacidade mágica de utilizar o chá como forma de conexão com outras pessoas foi bem interessante.
Meus receios eram: é um YA; é o livro de estreia de Judy I Lin; o livro é narrado em primeira pessoa, e isso pode ser uma questão, dependendo da voz da protagonista. Mas tive uma grata surpresa com a leitura como um todo. O começou foi um pouco truncado. Não sei se eu estava me acostumando com a “voz” de Ning narrando sua própria história, mas parecia que ela falava com a gente em frases curtas e pensamentos muito objetivos.
Talvez por ela não ter passado por um momento muito longo de “negação de aventura”, essa sensação tenha sido um pouco mais forte. Não existe uma contextualização muito desenvolvida do background histórico do país, da família de Ning. Você sabe só o necessário pra aceitar que ela está saindo de casa e se colocando em risco para salvar sua irmã.
Inclusive, Shu, a irmã de Ning, é o motivo de ela ir até a capital para participar do concurso dos shénnóng tú. A mãe de Ning era uma shénnóng shi, uma especialista na magia do chá, e tinha começado a passar as técnicas para Ning. Mas seu pai precisava de um aprendiz de medicina, e Shu não se sentia bem com toda a prática. As irmãs trocam de lugar, mas com o passar do livro você percebe que Ning tinha desde sempre o dom mais forte.
De qualquer forma, Ning prepara um chá que acaba matando sua mãe, e deixando sua irmã extremamente doente. Aqui foi um pouco confuso pra mim, porque eu achei que ela teria causado esses males com sua própria magia “descontrolada”, mas na verdade as ervas do chá estavam envenenadas, e Ning não deu valor à sua percepção shénnóng de que havia algo de errado.
Aqui que eu acho que ficou um pouco fraca a contextualização de porque as ervas estavam envenadas, e quando a explicação vem é meio corrida e não sei se consegui de verdade comprar as motivações.
Outra coisa que eu já quero chamar a atenção é a percepção de passagem do tempo. A autora não conseguiu criar ganchos temporais que me dessem a sensação de que muito tempo estava passando. A viagem de Ning de seu vilarejo até a capital pareceu ser em um estalar de dedos. Durante os desafios já dentro do concurso, às vezes existia um “vocês têm três dias para se preparar”, mas você não consegue ter a noção desse tempo passando.
No fim, não entendi se o tempo que Ning ficou na capital passando pelas provas, conhecendo pessoas, descobrindo os jogos políticos que estavam acontecendo, duraram uma semana ou um ano.
Uma coisa que me chamou a atenção foi o pequeno temor do instalove que rola um pouco no começo do livro. Ning fica perdida no mercado da capital quando precisa comprar ingredientes para a primeira prova da disputa e encontra um rapaz lindo e misterioso que faz lhe companhia e dá direções de lojas para conseguir o que precisa.
BAM! Instalove!
Mas no fim das contas, vou confessar que não me incomodou, porque o foco da história no fim das contas, não fica no romance. Ele existe, é meio que um slow burn, está envolvido com as tramas políticas da história, mas no fim você torce mas não se importa tanto com o relacionamento. Outras coisas são mais interessantes como a conexão de Ning, Lian e a imperatriz Zhen.
A gente costuma ver com muita frequência em livros com protagonistas femininas aquele comportamento possessivo e competitivo entre elas. As mulheres na história sempre estão disputando por alguma coisa, normalmente por homens, e muito raramente se respeitam e se ajudam. E eu tinha muito receio que isso acabasse acontecendo aqui, uma vez que temos um ambiente propício pra isso.
Mas a autora conseguiu criar uma amizade que eu comprei entre Ning e Lian, uma das competidoras do concurso. Lian não tem a soberba da aristocracia, se relaciona muito bem com guardas, o pessoal da cozinha e da limpeza. Como filha de um embaixador, Lian tem muita noção de relacionamento com as pessoas que podem de alguma forma serem aliadas em suas necessidades. Por isso, Ning e Lian acabam se dando muito bem, apesar de um início com alguns percalços.
Entre Ning e Zhen, a imperatriz, existe uma conexão mais de necessidade, mas que acaba virando um relacionamento de confiança. Ning acredita que se vencer o concurso e se tornar a shénnóng shi do reino, pode conseguir acesso ao antídoto para o veneno que afeta sua irmã. E Zhen precisa ter alguém em confiar no ambiente da corte, cheio de traições e homens com seus próprios objetivos escusos.
Momentos que gostei muito na desenvolvimento da história: a construção das cenas de preparação do chá são etéreas e acompanhar o raciocínio e o sentimento de Ning na seleção dos ingredientes e atributos que ela pretende extrair ao misturar no chá é muito interessante. Faz parte da magia que o shénnóng tú coloca no chá, e da doação que se faz à pessoa que vai beber.
Eu gostei bastante desse elemento de “soft magic” que está relacionado na conexão entre a pessoa que faz o chá, e a que toma. A troca de energias e intenções entre as duas pessoas, o poder que o shénnóng coloca ou tira da bebida e de quem a consumiu. Na verdade, o world building não é muito o forte da história, mas a pincelada que a autora fez sobre os deuses e o panteão da história, como interferem na sociedade e de como os deuses podem estar interessados na cisão do reino, acaba sendo uma camada interassante.
Como comentei, é difícil de ter a percepção da passagem de tempo, e em dado momento eu fiquei um pouco incomodada como Ning estava simplesmente se apegando aos luxos da capital e esqueceu da sua principal missão que era salvar a irmã. Esse assunto só volta mesmo já no clímax da história e é um pouco apressado pra chegar na resolução. Ficou estranho pra mim essa perda de objetivo e “do nada” ele voltar numa pegada de “é mesmo, tenho que salvar minha irmã”.
De qualquer forma, eu realmente gostei da leitura! Me entreteu, a personagem principal é interessante, tem um bom relacionamento entre as mulheres, o romance não rouba de uma forma negativa a história, o concurso e os desafios são bem construídos, a trama política é um pouco rasa mas dá informação suficiente pra você seguir em frente.
Vale comentar também que logo no começo existe um glossário com vários termos que são usados ao longo da história, e mantidos no original, tipo shénnóng tú. O glossário explica o significado e traz também a pronúncia. Só achei complicado porque eu não conheço as marcações linguísticas que descrevem a forma correta de falar as palavra, então, no fim, na minha cabeça soava xénon tu mesmo.
Quero ler o próximo e último, principalmente porque quero ter as duas capas bonitas aqui na minha coleção.
Até a próxima! o/
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