O desaparecimento de Stephanie Mailer
Intrínseca
série ---
576 páginas | 2019
Na noite de 30 de Julho de 1994, a pacata vila de Orphea, na costa leste dos Estados Unidos, assiste ao grande espectáculo de abertura do festival de teatro. Mas o presidente da Câmara está atrasado para a cerimônia…
Ao mesmo tempo, Samuel Paladin percorre as ruas desertas da vila à procura da mulher, que saiu para correr e não voltou. Só para quando encontra o seu corpo em frente à casa do presidente da Câmara. Dentro da casa, toda a família do presidente está morta.
A investigação é entregue a Jesse Rosenberg e Derek Scott, dois jovens polícias do estado de Nova Iorque. Ambiciosos e tenazes, conseguem cercar o assassino e são condecorados por isso. Vinte anos mais tarde, na cerimónia de despedida de Rosenberg da Polícia, a jornalista Stephanie Mailer confronta-o com uma revelação inesperada: o assassino não é quem eles pensavam, e a jornalista reclama ter informações-chave para encontrar o verdadeiro culpado.
Dias depois, Stephanie desaparece.
Assim começa este thriller colossal, de ritmo vertiginoso, entrelaçando tramas, personagens, surpresas e volte-faces, sacudindo o leitor e impelindo-o, sem possibilidade de parar, até ao inesperado e inesquecível desenlace.
O que aconteceu a Stephanie Mailer?
E o que aconteceu realmente no Verão de 1994?
Design
Esse foi o primeiro livro lançado pela Intrínseca quando começou o clube Intrínsecos. E essa é a versão comercial do livro, lançado pro público em geral nas livrarias.
E é um tijolo. ^.^’
Afinal, 576 páginas, se não for em e-book, invariavelmente vai ser um livro muito grosso e pesado. Foi meio que por isso que deixei pra ler no estilo “maratona” durante o carnaval.
O desaparecimento de Setephanie Mailer é um daqueles projetos gráficos tradicionais da Intrínseca. Não existem muitas diferenças no projeto em si, mas o acabamento e o cuidado com a montagem do livro como um todo é padrão Intrínseca.
A capa é uma ilustração que ajuda bastante o leitor a ter uma ideia do clima e da atmosfera de Orphea, a cidade dos Hamptons onde ocorrem os crimes investigados. Na verdade eu assumi que o prédio ou era a prefeitura, ou o teatro municipal, ou a sede do jornal. Independente, ajuda a montar uma ideia do lugar.
O lettering do título e do nome do autor segue o padrão que a editora já começou com as outras obras. Fonte san-serif em caixa alta e uma construção bastante geométrica do posicionamento dos textos.
O miolo é bastante correto e não tenho nada para reclamar ou elogiar demais. O que me chamou atenção aqui foi só uma coisa que é da construção da história em si, mas que é muito legal. Todas as aberturas de parte começam com um número negativo (tipo um -7) e é meio estranho quando você começa a ler. Depois você meio que entende o sentido e é muito bom ver esse elemento ali.
História
Uma das coisas maravilhosas de não ler tantos thrillers quanto eu gostaria é que acabo não tendo muita experiência com as “fórmulas” do gênero. Isso sempre me permite realmente aproveitar a leitura sem ficar preocupada em como a história vai se desenrolar.
Uma outra coisa que eu me permito sempre é acompanhar o ritmo da história. Eu estou sempre junto com os personagens e não costumo me esforçar para ser mais inteligente que o autor e tentar descobrir o culpado antes da hora que ele achar relevante contar pra gente.
Tá bem que quando essa hora fica muito pro fim vai me dando angústia e nervoso de não dar tempo de fechar todas as pontas soltas. Mas já posso adiantar pra você (se sofrer como eu com esse tipo de coisa) que Joël Dicker consegue ser um maravilhoso escritor no sentido de me deixar COMPLETAMENTE envolvida, entretida, e imersa no caso de Stephanie Mailer.
Ele sabe quando sua história pode começar a perder o leitor e é nesse momento que ele solta alguma coisa pra você voltar a focar. Ele sabe quando você começa a pensar na lista de compras do supermercado, na mancha do tapete, que acabou o sorvete e PÁ, TOMA UMA REVIRAVOLTA NA SUA CARA. Ou seja, ele constrói o ritmo da forma ideal para te dar aquele respiro e te trazer de volta a história nos tempos certos.
Eu ainda não tinha lido nada do autor belga, mas fiquei bastante satisfeita e impressionada com a qualidade do texto e da narrativa que ele desenvolve. Porque, assim, tem MUITO PERSONAGEM nessa história.
Não… você não tá me entendo. Tem muito mesmo! E tem uns que você nem entende porque estão sendo apresentados e introduzidos na história. Você fica meio “de onde você surgiu, mesmo?”.
O bom é que o autor colocou uma lista de personagens logo no início, o que eu achei que podia ser um spoiler, ou estragar a experiência da leitura. Só que é tanta gente que você acaba esquecendo mesmo. Então, em diversos momentos eu me vi indo até o começo do livro para lembrar quem era aquela pessoa.
Outra coisa que eu achei essencial para a construção do ritmo foram as interrupções dos personagens para contar seus pontos de vista sobre alguma coisa. Assim, o PoV principal é do Jesse, que é o capitão da polícia que trabalhou no caso de 1994 mas que foi envolvido novamente em sua reabertura por “culpa” da Stephanie Mailer.
A Stephanie em si é uma personagem meio “plot device” para engatar a história e é um pouco triste que ela não seja tão presente. Mas, mesmo não aparecendo tanto como protagonista, ela é o catalizador de muitas mudanças em todos os outros personagens e na história em si.
Tem coisas que a gente só acaba descobrindo quando os próprios personagens decidem contar pra gente, em seus momentos meio “confessionário do BBB”. Sabe quando em algumas séries de TV, no meio de uma situação um personagem é destacado para falar sozinho sobre suas impressões ou experiências, que derivam de algum acontecimento relacionado ao que está acontecendo na história?
É exatamente isso que Dicker faz aqui. Por exemplo:
- Dereck, o antigo parceiro de Jesse na investigação de 1994, é o responsável por sempre dar o flashback do que aconteceu naquele ano e naquele caso, contando como tudo foi conduzido na época. E é dessa forma que a gente começa a fazer paralelos sobre o que foi descoberto incialmente, e o que está sendo apresentado no caso hoje.
E, por conta desse paralelo, acaba que a gente fica com a sensação de que o trabalho de Jesse e Dereck em 1994 foi meio “zoado”, beirando a uma certa “incompetência” em alguns momentos. Em diversos momento do “futuro” eles se pegam não sabendo alguma coisa, ou não tendo se questionado sobre algo na primeira investigação.
Tudo bem que não se tinha o volume de acesso a informação que se tem hoje em dia, mais de 20 anos depois. Mas eu ficava meio “como asseam?!” quando Dereck ou Jesse percebiam que não tinham considerado diversas coisas que parecem quase “naturais” para Ana.
Falando nela, Ana é minha personagem favorita na história e eu me revoltei junto com ela por todo machismo que ela enfrentou na força policial e no relacionamento com sua família e ex-marido.
Nos momentos que temos acesso a suas lembranças sobre como ela “abandonou” uma carreira de advogada para se tornar policial; o quanto sofreu por sua família não apoiar sua decisão; a escolha de um marido que agradava seu pai, mas que na verdade era só um relacionamento tóxico em sua vida; o desrespeito que sofreu em Orphea pelos colegas policiais ao ser vista como uma “ameaça” à supremacia masculina do departamento de polícia… Foi sofrido! Minha gastrite que o diga! XD
Tive sentimentos altamente conflitantes sobre Dakota, a filha drogada de um dos personagens. Tinha momentos que eu só queria dar uns tapas na cara dela por estar se destruindo e à sua família por tabela. Mas sua história acabou sendo mais complexa e profunda do que eu esperava. Deu mais camadas para eu criar uma certa empatia e diminuir a minha agressividade em relação à personagem.
Em diversos momentos, Dicker consegue desenvolver os relacionamentos dos personagens mostrando como todos podem estar envolvidos com mentiras ou omissão da verdade, romances e relacionamentos abusivos e tóxicos. Em um deles, uma jovem mulher é de enfurecer!
Dicker mostra a forma como ela destrói tudo o que o homem que ela escolheu como “vítima”, construiu ao longo da vida. Outro momento em que minha gastrite cantava de tanto ódio que eu senti da personagem! Mais pontos positivos pro autor.
Agora, falando um pouco da história, porque eu começo a me empolgar e escrevo o que vem na minha cabeça sem nenhuma ordem lógica…
Toda construção do desenvolvimento do caso atual, da Stephanie Mailer que dá nome ao livro, é EXTREMAMENTE envolvente e instigante. Mas, ainda assim, em alguns momentos eu me vi querendo pular algumas páginas, não porque estava chato, mas porque eu queria as respostas AGORA!.
Muito disso tem a ver com o estilo narrativo do Dicker. A forma como ele usa subterfúgios e falsas pistas para conduzir o leitor e os personagens em caminhos incorretos, me lembrou muito a forma como Agatha Christe conduzia seus romances.
Ela apontava um suspeito e fazia com que você tivesse CERTEZA que o personagem era o culpado; mas não era bem assim. Dicker consegue fazer praticamente a mesma coisa que a rainha do crime, o que ajuda o livro de 576 páginas a não parecer tão longo ou difícil de ler. Sério. Passa voando!
Além disso, como eu já falei um pouco de alguns personagens, dá pra perceber que em grande medida, eles são interessantes, profundos, amáveis/odiáveis dentro de seus papéis na história. Gente… o diretor de teatro/chefe de polícia! Ou o crítico de arte! É de querer matar! XD
Apesar de o fim vir de certa forma ligeiramente apressado, as respostas e justificativas são completamente plausíveis e críveis. E sim, elas vem depois de diversos plot twists ao longo da história, e você fica satisfeito com o resultado final.
Agora vou TER que ir atrás dos outros livros do autor lançados pela Intrínseca. Só tenho a única expectativa de serem tão bons quanto O desaparecimento de Stephanie Mailer. Básico. :P
Quando você mata uma vez, pode matar duas. E quando mata duas, pode matar a humanidade inteira. Não há mais limites. p.568
Até a próxima! o/
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