faca de água
intrínseca
série ---
400 páginas | 2016
Num futuro árido e tumultuado, em que a água ganhou o status de commodity mais valiosa, o direito de uso das fontes e dos rios é alvo de disputas ferrenhas. Uma guerra entre governos, órgãos públicos e empresários, na qual vale tudo.
Enquanto advogados e burocratas armam-se com infinitos processos judiciais, mercenários e militares subjugam proprietários de terra, implodem estações de tratamento e interrompem o abastecimento de regiões inteiras.
Nesse cenário surge Angel, um faca de água, um dos muitos mercenários com a missão de cortar e desviar o fornecimento de água a mando de quem paga mais. Lucy é uma jornalista premiada que decidiu revelar para o mundo a realidade da Grande Seca. Maria é uma jovem cuja vida foi destruída pelos efeitos das mudanças climáticas. Quando o direito de usar a água significa dinheiro para alguns e sobrevivência para outros, o que esses três personagens não sabem é que seu encontro é um marco que poderá mudar tudo. Um novo fiel da balança que sempre pendeu para o mesmo lado.
Futurista, mas nada improvável, Faca de Água é um thriller que perpassa por questões econômicas, ambientais e éticas numa narrativa que extrapola o gênero, daquelas que se lê de uma tacada só e depois leva-se um longo tempo assimilando.
Design
Eu já queria dar 5 estrelinhas, assim que o livro chegou, logo logo depois que abri a caixa da Intrínseca. Sério! É um livro tão bonito! <3 A capa preta com a aplicação metalizada azul no título, essa arte que dá a impressão que é água escorrendo pelas letras, o detalhe no pingo do logo da Intrínseca também em azul… Essa é uma daquelas capas tipográficas que não precisa de mais nada além daquilo que a fonte e as interações visuais já criaram de efeito. Muito amor envolvido aqui!
E as bordas, Pessoas! Todas pintadas de preto, transformando o livro em um pequeno bloco escuro em cima da sua mesa, ali na sua estante.
Aí você vai para o miolo e as aberturas de capítulo são todas com chapadas de preto também, e a fonte fica em “branco” para a leitura. Estava tentando criar uma metáfora para isso, mas não veio nada muito interessante, então eu deixo só a questão de que é maneiro!
Entretanto, aqui eu tenho uma consideração a fazer. Em alguns capítulos ficava um pouco difícil de ler os parágrafos na página de abertura, como se a tinta preta houvesse invadido um pouco a área das letras, de forma que elas ficaram um pouco mais finas do que deveriam. Mas fora isso?
Perfeição! *-*
Eu diria que faltou um mapa. Não é uma história de fantasia, mas para quem não mora nos EUA saber onde se localizam os cenários da história não é tão simples. Mas isso não interfere em nada a qualidade final do projeto visual de Faca de Água.
História
Sabe vibe errada? Então. Foi exatamente o que me levou a ter uma certa surpresa inicial quando comecei a ler Faca de Água.
Por algum motivo que eu não faço ideia e nem de como explicar, li a sinopse e esqueci completamente do que o livro realmente se tratava. Acho que as únicas informações que eu “quis” guardar foram: 3 personagens principais, futuro distópico, disputas por água, e uma faca que na minha cabeça ia ser de água. O.o
Na minha cabeça de jerico eu estava esperando, sabe-se lá por que, uma história nos moldes de Uma Chama entre as Cinzas. Não sei de onde eu tirei que o livro ia ser um YA! o.o Estava tudo escrito lá na sinopse, contextualizando uma história completamente atual e eu esperando uma história de fantasia. Eu só mereço um grande facepalm.
Minha experiência inicial com Faca de Água foi bastante truncada e acredito que isso atrapalhou muito meu envolvimento com a história e com os personagens. Como os capítulos são relativamente curtos, trocando constantemente os POVs, eu acabei lendo esse começo quase que um capítulo por dia. Não tinha como criar vínculo direito. Os 25% iniciais foram praticamente todos dessa forma. Eu boto a culpa também no transporte público… diminuiu o tempo que eu fico no metro desde que voltei a trabalhar, e minha qualidade de leitura caiu muito… #mimimi #problemasdeleitora
Atrapalhou também que o começo da história é bastante lento. Tanto por conta da apresentação dos personagens e da contextualização de cada um na história. E se você quiser saber como a humanidade chegou a esse ponto, não se anime muito. Não existe bem uma explicação do que houve com o planeta para que começasse essa guerra interna nos EUA por conta de água. A única afirmação constante é que já haviam sido feitos estudos há pelo 150 anos que indicavam uma crise hídrica, só que ninguém levou o alerta realmente em consideração.
Não vou entrar em muitos detalhes de alguns termos ao longo da leitura. O autor escreve muito como hard sci-fi, o que significa que ele tenta tornar o mais próximo da realidade da ciência possível todas as informações tecnológicas que faz ao longo da leitura. E, bem, não acho que é muito meu papel ficar aqui replicando as explicações que estão lá no livro. Pega aqui na minha mão, e tenta curtir a jornada, mesmo sem entender completamente o conceito. Acredite, eu não entendi tudo até depois que terminei a leitura…
Então, vamos começar com um mapa para todo mundo entender aonde se passa a história. Olhar para o mapa dos EUA foi uma das principais coisas que me ajudaram a fazer com que todos os acontecimentos começassem a realmente ter algum sentido. Sem saber onde realmente fica Phoenix, Los Angeles, Arizona, Nevada, Califórnia, Texas, e por onde passa o rio Colorado, que é o principal pivô da história, estou afirmando que você vai perder mais da metade do sentido do livro.
Nevada é um dos estados mais ricos em quesito de água, muito por conta de sua “governadora” Catherine Case, que comanda as arcologias Cypress, e grande parte do volume de água que ainda resta no Colorado e passa por suas fronteiras. Ela comanda tudo de Los Angeles, que é onde a história começa. Um de seus principais facas de água é Angel (se pronuncia Anrel), e ele é o responsável por aplicar as sanções em cidades próximas que tentam drenar água do rio em poder de Nevada.
É por conta dessa aplicação das leis que limitam o acesso de uso da água que esses agentes são chamados de facas de água. Eles são temidos também por incentivar milícias de fazendeiros, por explodir diques e ameaçar cidades inteiras com o corte do suprimento de água.
Catherine acredita que algo grande está acontecendo em Phoenix, uma das principais cidades do Arizona, onde ela já tem espiões instalados, por isso envia Angel para tirar a limpo qual é a situação por lá.
Em Phoenix é onde estão as duas outras personagens que fazem a história andar. Lucy é uma jornalista de grande renome, ganhadora de prêmios importantes, que decidiu ir para Phoenix acompanhar e relatar o declínio da cidade. Ela é a personagem idealista, e de certa forma otimista, da história. Ela quer consertar o mundo, quer que todos tenham a oportunidade de saber as verdades que existem sobre toda a podridão e corrupção por conta da divisão (desigual) da água. Só que ela é envolvida em uma situação de extremo risco quando um amigo advogado de água é encontrado morto depois de ter sofrido tortura.
O último elo do triângulo é Maria, uma texana que encontrou “asilo” em Phoenix com o pai, mas que agora, sozinha depois que ele morreu, precisa fazer o que for necessário para sobreviver. Uma amiga que se prostitui para garantir seu sustento dá uma dica que ouviu de um dos seus clientes sobre compra de água, e Maria vê a oportunidade de fazer muito dinheiro e fugir para o norte. Só que Maria não contava com toda a linha de comando das gangues e máfias que existem na cidade, e acaba mais enrascada do que estava antes de sua super ideia de ficar rica.
Esses três personagens vão se envolver nessa cidade desértica, atacada por tempestades de areia, e por alto surto de preconceito, xenofobia e violência, para tentar sobreviver em uma sociedade totalmente corrompida e destruída.
Quando eles começam a interagir é que a história realmente se torna interessante, porque você começa a entender qual é toda a trama que está acontecendo em Phoenix. E é muito envolvente! De certa forma, vira um livro mais de thriller do que realmente um futuro distópico. Mais do que a definição do mundo, a história é sobre corrupção, traição, violência, luta por direitos e relações humanas. Quase não faz diferença o fato de eles estarem em um país quase desértico lutando por direitos de água. Essa trama poderia acontecer em qualquer tipo de cenário.
É muito interessante ver a interação de confiança que Angel tem com sua chefe, uma relação de gratidão até, e o quanto ele gosta do que faz. Como ele se relaciona com Lucy depois que eles se encontram. Eu gostei muito da dinâmica dos dois juntos. O sofrimento que Maria passa para conseguir tentar sobreviver às suas dívidas, do que ela abre mão e o que ela realmente perde para conseguir ter mais um dia de vida. E no fim das contas, a responsabilidade que passa a carregar com ela, sem nem ao menos se dar conta.
Acho que dos três, Lucy é a única que me deixou meio incomodada. O comportamento dela ao longo da história, sua traição, sua forma de enxergar o mundo, como se ele ainda pudesse ser salvo de alguma forma, beira ao irrealismo. Ela vive em eterna angústia por ter visto e até vivenciado o pior do cerumano, mas mesmo assim ainda tem aquela vontade idealista de salvar o mundo…
Angel e Lucy, cada um à sua maneira, vê a situação atual de uma forma mais realista e objetiva, focando naquilo que eles acreditam que vai trazer mais benefícios para eles. O mundo já está muito ferrado para eles se preocuparem com mais alguém além de si mesmos.
E acho que por conta disso que eu terminei Faca de Água me sentindo culpada. Porque eu gostei do final. Gostei e achei que estava certa a forma como o autor definiu a conclusão da história dos três personagens. E me senti culpada porque eu deveria ter mais esperança no cerumano. Deveria acreditar que as coisas podem melhorar, que a gente pode ser bom e conviver em sociedade de uma forma equilibrada.
Só que não. Paolo Bacigalupi mostra o pior das pessoas no pior momento do mundo. Elas não se ajudam. Elas não são humanitárias. Elas não se importam. Como sempre, o maior lucro importa, independente dos custos. E eu acho que não precisa um desastre hídrico para mostrar isso. Nós já somos assim, é só olhar os noticiários todos os dias.
Então, se você gosta de uma história com plot twists interessantes e envolventes, personagens tridimensionais, violência, não espera uma explicação para o background do cenário distópico, e se você conseguir passar pelas 70-100 páginas iniciais, garanto que vai valer bastante a pena a leitura. E não, não existem facas feitas de água em Faca de Água. Fica o aviso. ^.~
Até a próxima! o/
Descubra mais sobre Parafraseando Livros
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.
7 Comentários
Eu terminei o livro hoje, achei a história bem boa, com três pequenas exceções:
1 – O começo é lento, demora para engrenar. Mas quando pega, vai de boas.
2 – Dos três personagens, achei a Maria a mais afastada e praticamente desconexa, sua importância só se dá em relação aquilo lá que você sabe o que é heuahe
3 – Não curti o final. Se é livro único, o fim ficou meia boca, cortado de forma inesperada. Se vai ter continuação, então aí da até pra perdoar da forma que a trama terminou.
Oi Reinaldo! Concordo com você em todos os três pontos, e até onde eu sei (olhando no goodreads do autor), o livro não tem continuação mesmo. Então o final é caído de qualquer forma.
Se você curtiu o clima da história, talvez curta Silo, do Hugh Howey. Se você ainda não leu, ele tem esse clima de devastação, mistério e “distopia” que tem em Faca de Água.
Obrigada pela visita e por deixar sua opinião! o/
Oi Samara, bah então o final ficou meia boca mesmo hahaha
Esse Silo faz tempo que pretendo incluir na meta de leitura.. mas ainda não deu hahaha mas as reviews dele são ótimas (daria um bom filme, acho) hehe
Eu estou lendo sesse livro agora, e a sua dica quanto ao mapa ta me ajudando demais. Estava totalmente perdido geograficamente e o tempo todo dizia pra mim mesmo que precisava de algum mapa pra me localizar.
Sua ajuda foi muito bem-vinda, obrigado.
Que bom que o mapa te ajudou, Willian! Depois me conta o que achou do livro, quando você terminar. ^.~
Terminei de ler o livro ontem. Eu tava gostando demais, mas ali pelos 70% eu acho que o autor começou a enrolar demais. Eu ja tava em 95% e não tinha nem sinal de que o desfecho iria acontecer. Mas o final eu achei bem legal, e como eu acho que deveria ter acontecido.
No mais é uma boa leitura, mas nao chega a 5 estrelas.
Sim! O final é exatamente o que deveria acontecer, mas mesmo concordando com o autor, ainda tive um leve sentimento de “culpa” por ser como foi. Que bom que no geral você gostou da sua experiência de leitura.
Se eu puder sugerir uma outra leitura da Intrínseca, experimenta Léxico. Talvez você ache interessante também. ^.~