loney
intrínseca
série ---
304 páginas | 2016
Quando os restos mortais de uma criança são descobertos durante uma tempestade de inverno numa extensão da sombria costa da Inglaterra conhecida como Loney, Smith é obrigado a confrontar acontecimentos terríveis e misteriosos ocorridos quarenta anos antes, quando ainda era criança e visitou o lugar.
À época, a mãe de Smith arrastou a família para aquela região numa peregrinação de Páscoa com o padre Bernard, cujo antecessor, Wilfred, morrera pouco tempo antes. Cabia ao jovem sacerdote liderar a comunidade até um antigo santuário, onde a obstinada sra. Smith crê que irá encontrar a cura para o filho mais velho, um garoto mudo e com problemas de aprendizagem.
O grupo se instala na Moorings, uma casa fria e antiga, repleta de segredos. O clima é hostil, os moradores do lugar, ameaçadores, e uma aura de mistério cerca os desconhecidos ocupantes de Coldbarrow, uma faixa de terra pouco acessível, diariamente alagada na alta da maré. A vida dos irmãos acaba se entrelaçando à dos excêntricos vizinhos com intensidade e complexidade tão imperativas quanto a fé que os levou ao Loney, e o que acontece a partir daí se torna um fardo que Smith carrega pelo resto da vida, a verdade que ele vai sustentar a qualquer preço.
Com personagens ricos e idiossincráticos, um cenário sombrio e a sensação de ameaça constante, Loney é uma leitura perturbadora e impossível de largar, que conquistou crítica e público. Uma história de suspense e horror gótico, ricamente inspirada na criação católica do autor, no folclore e na agressiva paisagem do noroeste inglês.
design
Fiquei bastante impressionada com alguns dos últimos lançamentos da Intrínseca, que estão chegando em capa dura com jaqueta/sobrecapa. Loney é um desses livros.
A sobrecapa é bem bonita, a imagem passa toda a ideia do que eu achava que iria encontrar durante a leitura. Um ambiente lúgubre, frio e de certa forma angustiante. Essa casa solitária nessa praia sinistra é muito exemplar para ilustrar o lugar para onde os personagens viajam durante a história. E esse título totalmente clássico, com essa fonte meio romana, mas envolvido pelos galhos retorcidos de uma árvore “morta”… Por favor, quero medo e quero sustos! O.O’
O legal também é que a capa é praticamente monocromática em tons de cinza (nada a ver com um certo personagem) que combina completamente com a história, mas você tem dois focos de cor vermelha, no nome do autor e no pingo do i do logo da Intrínseca. Para mim, era mais um elemento do que poderia me aterrorizar durante a leitura… E toda essa atmosfera se estende para a quarta capa, que é a continuação da praia vazia e assustadoramente nem um pouco acolhedora.
Falando de acabamentos especiais, a sobre capa é toda em soft touch, e tem aplicação de verniz localizado na área do título e dos galhos, só que no meu exemplar esse verniz veio fora de registro, então não foi impresso no lugar certo. Obviamente que eu não fiquei carregando o livro por aí com a sobre capa, correndo o risco de rasgar ou amassar a bichinha. O legal é que a capa dura do livro é toda em preto e tem impresso em branco o título, uma casa bizarra e os galhos sinistros. Então ainda dava para alardear para todo mundo o que eu estava lendo.
Sobre miolo. A arte da capa é trazida para dentro do livro nas folhas de rosto, logo no início, reforçando todo o clima que você está para mergulhar. O projeto gráfico em si é bem bonito, como praticamente todos que a Intrínseca faz! Apesar de não ter área de cabeçalho neste miolo, e de terem sobrado uns errinhos de revisão, achei que a estrutura física do projeto ajudaria o leitor a ser envolvido por um clima sombrio, se a história conseguisse construir essa ambientação.
história
Tive alguns problemas com Loney sendo os principais a questão religiosa, o mistério que não engatou ou foi interessante em nenhum momento, a lentidão da história, e a forma um tanto truncada como o narrador alterna os períodos de tempos em que está contando os acontecimentos.
Quando eu era pequena e chegou aquele momento de sair da creche e entrar na Primeira Série, meus pais decidiram me matricular em uma escola católica aqui do Rio de Janeiro. Minha família nunca foi praticante ou atuante no quesito religioso. Entrei em um colégio católico sem saber rezar uma ave-maria ou pai-nosso. E ao longo dos meus primeiros anos de formação fui bombardeada com informações sobre bíblia, djisus e delz.
Tive aula de religião. Tive professoras que eram freiras. Participei de incontáveis missas durante dias normais de aula. Fiz a primeira eucaristia, não porque realmente soubesse o que significava, mas porque todos os alunos da minha série também iam fazer. Porque tinha roupa especial e uns santinhos maneiros para trocar no dia do evento em si. Imaginem pokemons, só que com cartinhas de crianças sendo banhadas pelo espírito santo. Gotta get them all. ^.~
Só que quando eu atingi a adolescência e passei a ser um cerumano um tanto quanto chato e contestador, o que eu mais ouvia na escola era “porque delz quis”, “porque delz fez”, “porque não se questiona delz”. E o que você mais faz é questionar os dogmas. Por que eles são assim? Por que tantos rituais? Por que não comer carne uma vez por ano?!
Por mais que eu me sentisse tranquila e calma na principal capela da escola, aquele moço com cara de sofrimento, uma coroa de espinhos enfiada na cabeça, e todo pregado na cruz lá na frente do grande espaço era assustador e aterrorizante.
Então, sim. Estudar lá me afastou da religião. Porque eu gosto de perguntar e entender as coisas do jeito que elas são. Fé é um conceito difícil e quase inatingível para mim. Rezar é um ato estranho. E ver o que as pessoas fazem em nome da religião me angustia imensamente.
Então, nesse quesito, Loney foi uma leitura angustiante. O personagem principal, que em nenhum momento é chamado pelo nome, só por um apelido (Tonto) que o padre de sua paróquia lhe dá, está envolvido por toda uma comunidade fortemente religiosa e arraigada em suas crenças e tradições. E por mais que o livro se passe na década de 1970, dá muito nervoso ver o que a mãe de Tonto faz e como trata seus dois filhos por conta de sua fé.
O amado padre falecido que a todo o momento é relembrado pelos paroquianos, como forma de comparar com o novo padre enviado para a comunidade, era uma pessoa horrível. Em alguns dos momentos fragmentados que Tonto relembra seus dias como coroinha de padre Wilfred, ele relata situações de assédio moral intolerável. Tudo em nome da fé, e por achar que essa era a forma de salvar as almas das crianças que serviam na igreja.
O livro é tratado como um terror psicológico e eu, que sou a pessoa mais medrosa do mundo, não me assustei ou fiquei nervosa com o possível “terror” em momento nenhum. Posso contar nos dedos de uma mão os momentos em que o autor iniciou uma construção de tensão, que poderia desencadear uma série de eventos realmente assustadores. Mas na continuação da história voltávamos para a vastidão e o poder natural do Loney, como as pessoas morriam em suas marés incontroláveis e imprevisíveis, como os os paroquianos estavam vivendo a páscoa na Moorings…
Nem a tensão entre os personagens também gera qualquer apreensão. A disputa entre a Mamãe e a jovem auxiliar da igreja fica parecendo só uma questão de inveja e de quem tem maior controle das coisas entre os paroquianos.
Não dá medinho. Eu estava querendo algo no nível de Caixa de Pássaros. Tenso, angustiante, apavorante. O mar parece ser o único “ser” no livro que realmente pode gerar qualquer apreensão nos personagens. E mesmo na cena em que o Loney e o mar é realmente aterrorizante, a descrição foi feita de tal forma que eu não consegui entender o que estava acontecendo com o personagem principal e nem como ele quase se afogou.
Acho que a forma como a história é contada também é um problema. É uma construção muito lenta e densa do relacionamento entre os personagens que vão fazer a viagem para Moorings; os membros da família Smith; o novo padre da paróquia de São Judas Tadeu; o peso do padre anterior que morreu e o “mistério” de sua morte. E entre tudo isso, a fúria e o descontrole dos elementos do Loney que é basicamente um personagem secundário na história. Toda a ambientação, clima, e relacionamentos são feitos de forma arrastada, com muitas descrições do cenário, muitos diálogos entre os adultos. E demooooora para as coisas acontecerem, e quando aparece alguma situação interessante ela é esquecida logo em seguida.
Não tem mistério, porque nada do que é construído como sendo um mistério é desenvolvido ou finalizado. O corpo encontrado no Loney e que é o gatilho para a história? A menina grávida que aparentemente curou uma gaivota? O enforcado com coração espetado de pregos? A depredação da igreja em Coldtown? A forma como o padre Wilfred morreu? A cura “milagrosa” que acontece na história? Você não vai descobrir nada e acredito que o autor em nenhum momento teve interesse em realmente explicar nenhum desses “mistérios”.
Ele ainda insere a questão de ir e vir entre o futuro e passado do personagem principal, gerando trechos de história que ficam um pouco confusos de entender dentro do contexto geral. Não consegui criar uma linha do tempo formal para tentar entender a história.
Foi uma séria decepção. Definitivamente eu não sirvo pra ler o que lá fora chamam de Literary Fiction. A forma como o autor escreve é bonita, ele descreve bem seus cenários, criou personagens interessantes o suficientes para que eu conseguisse odiá-los, mas o livro como um todo não é para mim.
Até a próxima! o/
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2 Comentários
Vish… eu tô louca para ler esse livro e a primeira resenha que leio é negativa… hahahahah
Tudo bem, sou do tipo que precisa ler pra concordar ou não. Não perco interesse com opiniões de outras pessoas, mas foi bem interessante ver sua posição sobre. Principalmente pelo fato religioso.
Ai, Aline! Por favor, não deixe que minha opinião atrapalhe na sua vontade de ler o livro! Como você disse, você precisa ter suas próprias experiências com as leituras. Quando você ler, depois vem me contar o que achou? ^.^